terça-feira, 8 de dezembro de 2009

UM MÊS ESPECIAL


O mês de dezembro sempre foi muito especial para mim e a responsável por isso foi a minha mãe. Com salários minguados, ela e meu pai nem sempre tinham condição de atender aos pedidos que os quatro filhos despejavam todo ano nas cartinhas para Papai Noel, mas mesmo assim, ela fazia o Natal ser especial.
Mamãe incentivava em nós toda a fantasia que envolve essa data e, por isso, pasmem, acreditei no Bom Velhinho até os meus dez anos de idade. E agradeço muito a minha mãe por isso, pelas lindas lembranças de Natais maravilhosos em que ansiávamos pela noite do dia 24 e a manhã do dia 25. Íamos para a cama envoltos numa aura de mistério e excitação tão grande que demorávamos horas para dormir, na tentativa de flagrar Papai Noel trazendo nossos presentes.
Mesmo com alguma dificuldade, morando de aluguel e fazendo empréstimo a juros com o Seu Adão, dono da quitanda, meus pais sempre garantiam pelo menos um item da nossa cartinha. Se tinha a boneca Amiguinha, com certeza vinha uma boneca. Não era a Amiguinha, mas que também era linda. Se tinha patins Estrela, que tinha freio e amarrava na parte de cima dos pés, vinha patins. Não era Estrela, mas era o Bandeirantes, que não tinha freio e prendia os pés num encaixe lateral. Foi com ele que tatuei meus joelhos para sempre nas ruas do Grajaú.
Além do brinquedo da carta, apareciam, misteriosamente, vários outros presentinhos enfileirados no chão, ao lado da cama, que, anos depois, eu e meus irmãos ficamos sabendo que eram dados por colegas de trabalho da minha mãe e que ela escondia muito bem escondidos para, na noite de Natal, aumentar o prestígio do Papai Noel. E assim foram nossos Natais, e todos os dias de nossa infância, cheios de alegria, com muito amor e harmonia.
Minha mãe vivia e trabalhava para ajudar meu pai no sustento da casa e dar educação e boa alimentação para os filhos. Às vezes não entendíamos por que ela trabalhava, diferente das mães dos nossos coleguinhas que ganhavam os tais patins da Estrela e bicicletas Caloi e não aquelas bicicletas importadas, com freio contra-pedal, de segunda mão, que o papai comprava não sei onde. A vantagem disso é que sempre tínhamos mais de uma, e não dava briga na hora que eu queria sair de bicicleta e meu irmão mais velho também.
Mesmo trabalhando, minha mãe paparicava os filhos. Toda noite, antes de dormir, ela nos levava um copo de leite gelado, cheio de açúcar, reflexo da sua paixão por doce. Ela era uma formiguinha, mesmo. De manhã, penteava meus cabelos e antes de sairmos para a escola, preparava nosso café da manhã, que variava entre ovo quente, mingau de sagu e bife na manteiga. Ninguém fazia um bife igual àquele! E olha que ela era fraquinha na cozinha. O arroz era empapado e o feijão era aguado, mas o bife.....
Diferente da sua quase inoperância na cozinha, mamãe costurava muito bem e, frequentemente, fazia nossas roupas. Também era muito criativa. Por pura falta de tempo, nossas fantasias de Carnaval eram sempre improvisadas. Lembro de um ano em que ela pegou duas toalhas de rosto e costurou-as em cima e dos lados e nos vestiu de índios. Pintou-nos com batom e costurou algumas penas num pedaço de fita para fazer o cocar.
Papai reclamava dos paparicos dela com os filhos de tanto carinho e amor que nos dedicava. Dizia que era “mamãezada” demais. Mas ele reclamava de barriga cheia. Ela sempre foi sua grande cúmplice e companheira. Morria de ciúmes dele, mesmo depois de cinqüenta anos de casados.
Foi guerreira a vida inteira, principalmente nos últimos anos de vida, época em que lutou bravamente contra o câncer. Hoje, faria 87 anos e nos deixou há dez anos, quatro dias depois do seu aniversário, justo no mês de dezembro, o mês que ela transformava nossas vidas numa linda festa.
Aos meus irmão, com carinho,
Yone.


OS: Todos os filhos de mães como a minha afirmam que teem, ou tiveram, a melhor mãe do mundo. Acho que essa sensação vem do fato de termos a certeza de que, independentemente do que somos, ou fazemos, existe alguém que nos ama mesmo assim.